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Os Certificados de Macau em 1944



A emissão de numerário (notas, moedas, cédulas) revela-se representativa da identidade nacional de um povo, devido aos ornatos, efígies e outras gravuras que contém. Fica por isso vinculado com o período histórico em que foi emitido e quando circulou. Por esse motivo, exemplifica as idiossincrasias e as peculiaridades do tempo e do espaço a que pertenceu.

Os "Certificados de Macau", notas emitidas pelo Banco Nacional Ultramarino para circulação em Macau entre 1944 e 1947, são objetos cuja história atribulada é exemplificativa dos tempos conturbados que se viveram nessa ex-colónia no período da II Guerra Mundial.

Foi durante o ano de 1937, que em Macau e Hong-Kong se começaram a sentir os efeitos da Segunda Guerra Sino-japonesa, na qual o Japão ocupou parte do território chinês. Esta Guerra teve como efeitos em Macau, o crescendo da entrada de refugiados e o diminuir da entrada de moeda estrangeira. Prevendo efeitos deflaccionários resultantes de uma eventual interrupção do influxo de moedas estrangeiras num futuro próximo, o Governo de Macau, como medida cautelar, começou a acumular moeda de prata chinesa, que na altura era a que tinha maior valor intrínseco e aceitação local.

Esta medida permitiu acumular nos cofres da Fazenda mais de 2 milhões de Patacas em prata, o que, aliado a um Fundo de Reserva considerável em divisas estrangeiras, se revelou importante para mais tarde suportarem as emissões de papel-moeda para Macau durante os tempos de guerra.

O Japão havia iniciado a invasão da China com a tomada da Manchúria em 1931. A ocupação japonesa de grande parte do território chinês tornou-se uma realidade, devido à incapacidade das Forças Nacionalistas chinesas em travar o avanço nipónico.

Neste contexto, a ex-colónia de Macau estava votada a uma situação de reclusão, encravada que estava no meio de territórios ocupados, agravada em 1941, com o que é considerado o início da Guerra do Pacífico, quando as tropas japonesas atacaram Pearl Harbor (o que forçou a entrada dos EUA na Guerra) e a invasão de Hong Kong, para além de outros pontos estratégicos no sudeste asiático.

Esta escalada implicou o aumento de refugiados e da população em Macau. A necessidade de se encontrarem instrumentos de troca também se tornou urgente, devido ao gradual desaparecimento de moedas e de notas estrangeiras, que na altura giravam no território. Muitas delas provinham de Hong Kong (o British Trade Dollar), em conjunto com moedas e notas chinesas.

Os frequentes combates navais, em conjunto com o bloqueio que as forças japonesas votaram os territórios ocupados na China, fizeram com que as remessas de papel-moeda, provenientes de Portugal não tivessem a possibilidade de chegar a Macau. Uma dessas remessas tratava-se da ‘Emissão Pagode’ no valor de 3.769.975 Patacas que, sem possibilidades de iniciar viagem, se encontrava retida em Lourenço Marques (atual Maputo) – esta emissão só mais tarde circularia em Macau, a partir de 16 de novembro de 1945.

A Filial de Macau do BNU (inaugurada em 1902) perante este cenário de desaparecimento dos meios de troca, entendeu que teria de recorrer à emissão de moeda localmente. Exposta esta pretensão junto do Governo de Macau e após repetidos pedidos nesse sentido da parte do Governador da altura, Gabriel Maurício Teixeira, o Ministério das Colónias, em 1944, outorgou o Decreto n.º 33 517, no Diário do Governo, 1ª Série, n.º 25, que autorizava a Filial de Macau à emissão de Certificados como «moeda privativa da Colónia, do valor nominal a estabelecer pelo governador de Macau».

Estes Certificados tiveram, logo à partida, uma função provisória sendo previsto que a sua circulação cessaria assim que o restabelecimento das comunicações permitisse que a receção de notas no território se processasse com normalidade. Isto porque, apesar de equiparados às notas, com as mesmas garantias e submetidos ao mesmo regime jurídico, o seu valor assentava no crédito da entidade que os emitia (o BNU Macau) e não numa garantia real de uma reserva constituída.

A título de exemplo, no caso das notas emitidas pelo BNU, o volume de circulação tinha de ter em conta o valor da reserva monetária e não poderia ser superior a um terço desta última, tal como havia sido contratado entre o Estado português e o BNU. Daí, a relevância de previamente se terem acumulado divisas e prata no período que antecedeu o deflagrar da II Guerra Mundial no sudeste asiático, o que permitiu a emissão destes Certificados naquele período de isolamento na ex-colónia.

Por esse mesmo motivo, o Governo em Lisboa não tinha possibilidade de determinar os valores nominais, nem as quantidades a emitir e a fixar, uma vez que não poderia aferir das necessidades do mercado local. Desta forma, essa função recaía no Governador de Macau para apurar esses números.

Esta "Emissão Certificados" foi impressa na Litografia Sin Chon & Cia em papel de fabrico local e com recurso a pedras litográficas calcárias. Numa das faces, tinham os desenhos dos Certificados. Estes tiveram como modelo a ‘Emissão António Ennes’ para Moçambique. Na Emissão macaense, a efígie de António Ennes foi substituída pelo Escudo de Portugal com palmas e laço, o selo do BNU foi elevado e manteve-se a Rosácea no fundo mas com outro pigmento.

As pedras litográficas têm um peso aproximado de 35 Kg cada. Foram cortadas em forma de hexaedro retangular e com as arestas ligeiramente arredondadas. Apresentam na face frontal três desenhos distintos: um para a moldura, outro para o fundo e o último para a rosácea. O processo gráfico de produção dos Certificados foi a cromolitografia, que permitia a impressão a várias cores.

De modo a acautelar situações de fraude ou falsificação, mas também para o garante de uma fiscalização oficial da parte do Governo local, foi adotado que os Certificados teriam de conter as assinaturas manuscritas do Diretor da Repartição Central dos Serviços de Fazenda do Governo da ex-colónia e do Gerente da Filial do BNU de Macau – tal como estava consignado no artigo 2.º do Decreto n.º 33 517 e que não admitia assinatura por chancela. Tal medida fica espelhada pelo relato no qual o Gerente chegou a ter de realizar 5 mil assinaturas pelo seu punho por dia e, durante meses, assinou em média 1.500 a 2.000 Certificados diários.

Esta obrigação foi posteriormente alterada pelo Decreto n.º 33 577, de 15 de março de 1944, que autorizou a delegação dessas atribuições noutros funcionários do Governo (o Subdiretor ou os primeiros-oficiais) e do Banco (o Guarda-Livros, o Tesoureiro ou o Chefe de Serviços).

Ainda devido ao risco de falsificação, as pedras litográficas eram guardadas dia e noite por membros das forças armadas nas instalações da Litografia. O Gerente do BNU solicitou ao Governador uma força de soldados africanos que ocuparam a litografia com instruções rigorosas de não deixar ninguém entrar nem sair. Os operários da litografia não se podiam ausentar durante todo o decorrer da gravação dos Certificados. Tal implicou que o seu repouso noturno e todas as refeições fossem realizados nas instalações. Quando se interrompia o trabalho – à uma da tarde, às 8 da noite e à meia-noite – as pedras eram lacradas e seladas, bem como o gabinete onde ficavam sob a guarda de um Cabo europeu.

Apesar destes cuidados, a ‘Emissão Certificados’ foi das que sofreu mais falsificações das emissões para Macau – inclusivé, alguns exemplares falsos fazem parte da Coleção da CGD. A providência, efetuada pelo próprio Gerente da Filial, de inscrever manualmente pormenores nos desenhos dos Certificados permitiu identificar as primeiras falsificações para 100 Patacas. Essas inscrições de segurança foram:

  • o verso de Camões, “Por mares nunca dantes navegados”,
  • o dístico poveiro “Vai com Deus”,
  • e a letra grega ómega (Ω).

Estas inscrições, após a redução do desenho original nas pedras litográficas, quando as notas eram impressas ficavam invisíveis a olho nu. E, desta maneira, possibilitava identificar os Certificados falsos por não possuírem estas inscrições.

Estes Certificados tiveram também a particularidade de terem sido a única emissão do BNU em que os ornatos, os textos e as imagens no Verso da nota foram impressos na vertical.

Os Certificados apresentavam como data de emissão, 5 de fevereiro de 1944. Foram emitidos nos valores de 5, 10, 25, 50, 100 e 500 Patacas e cada valor facial tinha a sua cor. Na sua totalidade foram emitidos 1.284.000 Certificados até 1947, ano em que foram retirados de circulação.

CGD - Gabinete do Património Histórico
Nuno Carvalho
Fevereiro de 2010

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Pedra Litográfica